Saturday, April 12, 2008

Um quê.


Ele tinha um quê de paz torta dos homens. Andava cabriolado por entre as luzes da calçada, chutando qualquer lata no meio do caminho. Usava um terno preto e uma gravata azul que pendia em seu pescoço como um pêndulo marcando o tempo que faltava em sua vida, ou o tempo que sobrava. “Tudo é relativo, ele pensava” enquanto passava pelo parque e sentia inveja do mendigo que dormia no banco coberto por jornais. “Pelo menos ele não tem que pagar conta de luz por todas essas estrelas que iluminam o seu céu. Sem falar que nem precisa assistir jornal para se manter informado, mais envolto em notícias que ele, impossível.”

Ele tinha um quê do buquê murcho de rosas e margaridas que carregava na mão direita. Hora e outra, ele parava debaixo de um poste e cheirava as flores. “As flores de plástico não morrem”, cantarolou baixinho para si mesmo.

E daí, meu caros leitores, que ele tenha hipnotizantes olhos furta-cor? Debaixo de seu terno já sujo e desalinhado, tinha um corpo cansado e uma alma frustrada de viver dia após dias onde o sol nasce sempre amarelo, o céu quase sempre é azul e bandinhas com guitarras coloridas sempre tocarão em bares ûndergraundi. De qualquer forma ele nunca vai ouvir a resposta adequada para suas perguntas. Talvez porque ele não saiba fazer as perguntas certas, ou quem sabe as respostas não existam nessa dimensão ou não são emitidas em uma freqüência captada por seus ouvidos humanóides. Quem sabe se ele tentasse perguntar àquele cachorro, que dia após dia se senta debaixo da mesa do buteco nosso de cada dia, obtivesse as respostas que tanto anseia? Os Totós ouvem melhor do que a gente na maior parte do tempo.

O fato maior entre todos os fatos, é que essa noite ele poderia chutar o Totó que possuísse as respostas para todas as sua perguntas em troca do buquê que ele carrega na mão direita estar agora num vaso verde e branco com detalhes vermelhos e com água até a boca, em troca de possuir não um quê da paz torta do homens, mas possuir um quê dos caos absoluto dos enamorados.

Mas a vida não funciona assim, né? E lá vai o homem cabriolado, ora fugindo da luz e correndo para sombra, possuindo um grande quê dos rejeitados.

3 comments:

Fabricius said...

Ele nunca ia conseguir que o seu buquê estivesse num vaso verde e branco com detalhes vermelhos, ou nem mesmo num vaso azul de pirex... porque afinal de contas ninguem aceitaria um buquê de rosas com margaridas... simplesmente não são flores para serem dadas em conjunto! Talvez formem um bom conjunto na imaginação de algumas garotas, mas quando elas o virem concretizado...
Além disso, da formação estética não ser boa, as duas flores representam momentos muito distintos... e também apesar da nossa sinestesia de emoções conflitantes acreditar que diferentes sentimentos podem ser sentdos juntos, isso não se aplica à simplicidade e à grandeza das flores!!! :)

Pedro Gadelha said...

Nostálgico esse texto... hehehe!

Danii said...

kopsaoapkssapok...concordo!